Aquando da criação do mais recente projeto do Hospital Social – VIVAmente – no âmbito da intervenção na demência, foram realizados vários estudos e pesquisas do que era realizado no nosso e noutros países, no que concerne à estimulação cognitiva e sensorial.
Obviamente que nos debruçamos sobre a música e desta enquanto mais um contributo na nossa intervenção. Mas nunca imaginámos o que iríamos presenciar…
A Musicoterapia é, comummente definida como a “técnica de comunicação verbal e não verbal que utiliza a música e os sons com finalidades terapêuticas, para melhorar a saúde das pessoas.” É a técnica que utiliza a música para alcançar metas como: a reabilitação, a manutenção e a melhoria da saúde mental e física.
“Somos criaturas musicais de forma inata desde o mais profundo da nossa natureza.” (Stefan Koelsch, psicólogo Americano. A Música, ainda segundo o mesmo especialista, é “uma sucessão de sinais acústicos que os nossos ouvidos recolhem e enviam ao cérebro”. Aí, são descodificados e é-lhes dado significado. Existe a transformação de um som em “algo” compreensível.
No caso da demência, nomeadamente em doentes de Alzheimer, esta terapia facilita e promove a comunicação e as relações sociais. Consegue-se o aumento da auto-estima, elevando também a segurança em si mesmo – a música atua como “disparador” de pensamentos positivos e ideias criativas.
Através da experiência ganha após várias sessões individuais, percebemos como é impressionante como se produzem mudanças emocionais positivas e um maior domínio das emoções do idoso. Conforme relata uma das técnicas, “ muitas vezes, por não saber onde estão, os idosos com demência, mostram uma grande agitação, caminhando de um lado para o outro, fugindo… são caraterísticos os gestos repetitivos, a contração dos músculos (principalmente nos idosos que já se encontram quase totalmente confinados ao leito)… quando lhes colocámos a música, a primeira coisa que muda é a expressão facial! O comportamento altera, porque passam mais tempo sentados concentrados na música. A apreciar… a recordar… às vezes cai apenas uma lágrima ou um sorriso leve… mas um sorriso!!! Até a forma de caminhar fica mais coordenada.”. – Isto acontece porque o RITMO, elemento dinâmico da música, serve de estímulo em processos psicomotores, conseguindo uma maior coordenação dos movimentos, e atua como elemento relaxante perante desequilíbrios nervosos e problemas de stress.
Ainda a mesma técnica, refere “mesmo que não recordem a sua idade ou o nome, as letras das músicas da sua vida são o último que esquecem. É o caso, por exemplo, da Marcha da Barca, de Manuel Parada, que pude testemunhar ser cantada, quase na íntegra, por uma idosa com Alzheimer em estado avançado…”.
Para quem tem demência, estamos certos que a música pode ser a porta das traseiras da mente. De facto, está provado cientificamente que, as zonas cerebrais que estão envolvidas na lembrança da música e na resposta à música, não são muito afetadas pela doença de Alzheimer, ou outras doenças mentais. Uma das razões que fazem com que as memórias musicais sejam tão fortes, tem haver com a forma como a música entra no ouvido. Por incrível que pareça, a música (com significado para o ouvinte), tem a capacidade de ativar mais partes do cérebro do que qualquer outro estímulo.

Fizemos uma recolha das músicas de cada idoso e colocamos na “Caixinha de Música” (MP3). Colocamos as melodias que fizeram parte das suas preferências (mesmo que já não se recordassem…) na Caixinha e começamos a recuperar memórias roubadas pela doença… resgatamos do passado, emoções vividas, verdadeiros beijos do esquecimento!!!
“A rapidez de resposta face a música é surpreendente! Verificamos que a capacidade de amar e carinho permanece tão forte lá no fundo, que chega a ser inacreditável a reação perante a estimulação musical”, refere uma das técnicas da equipa.
Para já, não conseguimos uma “Caixinha de Música” para todos os nossos idosos… estamos a começar muito devagarinho, e sempre com as limitações próprias deste tipo de intervenções. No Mundo atual – mais concretamente no sistema de saúde atual!- podemos ter acesso a quase todo o tipo de receita sem problemas… De um antidepressivo de não sei quantos euros, por exemplo. Agora, se quisermos dar um sistema de música pessoal de 20€ aos nossos cerca de 100 idosos, isso daria muito trabalho… e despesa… porque a “música de cada um” não conta como intervenção clínica/médica. É uma “coisa” exterior. O Ser Humano é visto como uma máquina muito complicada. Um Ser Humano com Demência, como uma máquina muito complicada estragada!
A verdade é que não é feito nada, AINDA, sob o ponto de vista clínico para tocar na alma e no coração dos pacientes. Mas, repetimos, AINDA, porque mais uma vez, a nossa Equipa Multidisciplinar, através do conceito Hospital Social, pretende assumir essa lacuna, de coração aberto e atento à comunidade!

Angela Almeida

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